Sebastião Formiga analisa o espetáculo MEU EU, monólogo do ator Robson Oliver

Cena do monólogo “MEU Eu”, do ator Robson Oliver. Foto: Sebastião Formiga

Por Sebastião Formiga

Onde está a beleza das coisas e onde encontrar essa tal felicidade?
Fui ao teatro Ednaldo do Egypto assistir ao espetáculo “Meu Eu”, com texto e atuação de Robson Oliver, direção da pernambucana Maria Rita e da paraibana Letícia Rodrigues. A apresentação teve o intuito de angariar fundos para complementar a ida do espetáculo a um festival de teatro de Ubá, em Minas Gerais, representar a Paraíba. Mesmo com esse apelo, o ator e direção resolveram tornar gratuita a entrada ao público preto. Um momento histórico ver tantos expectadores pretos abrilhantando a plateia com seus belos penteados e sorrisos no rosto.

Por ser o segundo dia da liberação do uso de máscaras não passou despercebido o ar de leveza e sensação de liberdade para respirar, livres das máscaras, companheira de mais de dois anos ininterruptos…
O teatro estava com 80% da sua capacidade ocupada e o público atento ao espetáculo Um monólogo com mais de 40min de duração com uma caixa cênica lotada de uma encenação leve cheia de intenções, signos, histórias e verdades.

O texto do Robson retrata sua relação de garoto com sua Vó Dana. Entre memórias da infância e relação direta com ela e seus valores humanos, religiosos e principalmente a vida e o viver em um lar de pretos, pobres e invisíveis por uma sociedade branca, desajustada e mesquinha.

A encenação da Maria Rita e Letícia Rodrigues constrói com maestria os lugares de pertencimento do garoto Robson e sua Vó Dana. Muito bem encenado pelo ator que canta, dança, encena os entremeios das cenas e vive magistralmente a Vó e a se próprio quando garoto.

O cenário constrói um lugar rústico cheio de folhas secas, um símbolo forte na vida dos pretos como uma árvore seca que só tem a força da natureza para voltar a florir, varais com vários tecidos brancos estendidos e alguns objetos cênicos que coringa várias cenas ao decorrer do espetáculo. Do varal surge um manto branco que dá todo o significado da encenação construindo um mundo de simbolismo e beleza cênica desde as vestimentas, turbantes, criança, o balanço e o manto do mundo invisível das personagens. Ora em sombra; ora em coberta ou véu nas danças do candomblé que embelezam e enriquecem a encenação no costurar das cenas do espetáculo.

O personagem surge em um corredor, labirinto dividindo com tecidos brancos os dois lados da plateia, um apartheid. Um foco de luz nos leva ao teatro de sombra, um corpo em movimento estica as paredes do corredor de tecidos em busca de saídas… Um ventre, um parto, um lindo nascer para o início do espetáculo. Deixando na plateia a angústia de estar isolado, invisível, mas há uma luz no final túnel, essa luz é Robson, é Dana, é o sincretismo, é a ancestralidade…

Os quatro elementos da natureza ambientam e qualificam a história, a ancestralidade cênica condiz com o texto e nos leva aos lugares das personagens dando chão ao ator e fluidez as cenas com a simplicidade dos lugares vividos por Robson. O banho na bica lava a alma do menino que poderia ser o Deus presente em Vó Dana, cheio de peripécias e desenvoltura para amenizar as dores e a fome que vos rodeavam. Fica a lição de Robson: a beleza e a felicidade são para quem sabe ver e viver…

A ficha técnica se completa com a iluminação de Nilson Silva, sonoplastia de Bruno Delfino, gerenciamento de palco Gustavo Níquel e Josué Barbosa, maquiagem Romilson Rodrigues.

Sebastião Formiga é ator e diretor de teatro e cinema. Idealizador e diretor da Formiga Filmes