Impressões artísticas sobre o espetáculo paraibano CARAVANAS

Cena do espetáculo “Caravanas”. Fotos: Divulgação

por Sebastião Formiga*

Assisti ao espetáculo CARAVANAS, com direção de André Sátiro, da BODOPITÁ COMPANHIA DE TEATRO, de Campina Grande, em atividade há mais de 26 anos com vários espetáculos no repertório.

O espetáculo recebeu o apoio da Lei Paulo Gustavo, através da Secretaria de Cultura do Estado da Paraíba, patrocinado pelo MINC – Ministério da Cultura do Governo Federal. A encenação aconteceu no espaço cênico do Coletivo Alfenim, no Castelo Branco, em João Pessoa, coordenado pelo teatrólogo Márcio Marciano.

Em cena, seis artistas, sendo quatro atores e duas atrizes. A encenação tem como referência o dia a dia de uma companhia à procura de um texto ou uma nova ideia de montagem de um espetáculo. A rotina de reuniões concomitante com os fracassos de não chegar a nenhum denominador comum. O que montar? Um texto antigo ou algo novo? As confusões e decisões ficam sempre abertas a decidir depois, mas qual a decisão tomar?

Enquanto as decisões não vão sendo tomadas no dia a dia da companhia, os conflitos que ora são dos atores; ora são dos personagens, retratam o dia a dia de uma sociedade fadada à bancarrota, abarrotada de sentidos e conteúdos para dar conta em busca da sua sobrevivência. Insatisfações, cansaços, ao mesmo tempo inconformados, fragilizados e impotentes para assumir uma nova direção. Servem um vinho, cada um, tenta dar o seu melhor! Como na vida, famintos a disputar fatias de pizza, cantando, dançando fazendo suas performances no momento da embriaguez, abre-se o lúdico onde cada ator expressa seu real, sem filtro, cantando e performando os clichês da vida em uma sociedade desajustada pelo ego, pelas vaidades! Um grito nos cala. Até quando vamos morrer de fome rodando o pires sendo artistas?

Um dos brilhantes momentos cênicos com a clarividência na bola de cristal as vitórias desejadas e alcançadas. Um ponto alto no espetáculo com interpretações incríveis por todo elenco. Os conflitos e tentativas do grupo constrói e pontua muito bem todas as cenas do espetáculo dirigido pelo jovem mestrando, André Sátiro.

A sequência cênica reveladora da o grande trunfo do espetáculo! Quando se traz as lembranças da infância, em registros escolares, em família e outras situações.

Abre-se um arco-íris de possibilidades reais do artista criador que toda criança é. Cada um com suas lembranças, como eram lembrados na escola? Os trabalhos e a reflexões do artista que cada um carrega em si. E como perdemos isso ao longo do tempo? Moldamo-nos aos costumes e exigências fundamentalistas de uma sociedade midiática, virtual, mesquinha, regada à exploração trabalhista e negações de direitos.

Perdemos a criatividade? O jeito espontâneo? A leveza de ser se perde pelos ideais, pelas obrigações, pelo ter que ter, ter que fazer! Assim, segue até a cena final quando todos regozijam essa busca, esses encontros com o público ali presente. As questões que ficam em aberto constrói o grande trunfo do espetáculo!

O que somos? Para onde vamos? O que é? Como estamos fazendo nosso dia a dia no virtual? Por que temos que decidir? E se não decidirmos, quem decide por nós? Eis a questão: O que restou dos humanos? Voltamos a caverna ou nos plugamos a Matrix? Novos tempos… Novo normal? Estamos interligados, escravizados e convictos de que queremos ser isso? Está ligado e que o mundo virtual decida por nós? Novos tempos, velhos dias.

A cenografia retrátil confeccionada por Haroldo Vidal, se molda e absolve as cenas com significados diferentes. O figurino de Jefferson de Souza é super leve, em tons neutros, imprimindo o cotidiano e conforto para os artistas com destaque de cores e alegorias para vestes da cia de teatro em forma circense.

A trilha sonora operada por Futura Leonardo, em momentos minimalista, leve, cotidianizada dentro da proposta onde cada um faz o seus sussurros, pequenos sons, batuques, ora acentuada pelo forte e sonoro apito fabril que vai construindo o passo e o compasso rotativo dos atores nas cenas. A iluminação de Gláucio Bezerra em tom claro, cor branca, cria o contraste Black whit com o espaço em caixa preta, deixando os atores mais expostos aos caos de cada um.

No elenco: Anderson de Sá, Chico Oliveira, Elio Penteado, Emília France, Joana Marques e Oscar Borges. A identidade visual ficou cargo de André Sátiro.

*Sebastião Formiga é ator e diretor e escreve como colaborador